Parcerias de Sucesso: A Trajetória da Arquiteta Paisagista Cássia Dias
Autor: Victor Campanate - Data: 01/07/2024
Para começar esse mês de comemorações dos nossos 25 anos com o pé direito, a entrevistada do mês de julho está com a AuE desde os seus primeiros passos. Uma arquiteta-paisagista de renome, Cássia é uma das nossas primeiras clientes e possui uma carreira marcada por paixão por paisagismo e a habilidade de se adaptar às diversas mudanças que a vida lhe trouxe.
Cássia Regina Dias Ribeiro é uma arquiteta e urbanista formada pela Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (UNESP). Ela também é especialista em Espaço e Paisagem pela Faculdade de Belas Artes de São Paulo e mestre em Arquitetura e Construção pela Unicamp. Durante a faculdade, Cássia se interessou pela área de Urbanismo e paisagem. No terceiro ano, teve a oportunidade de fazer um estágio no departamento, onde trabalhou com o levantamento e catalogação digital de espécies vegetais. Esse estágio despertou seu interesse pelo paisagismo, e desde então, ela direcionou seus trabalhos acadêmicos para a área externa, cidade e paisagem. O professor Cláudio Goia foi um dos grandes incentivadores de sua carreira, proporcionando a ela um estágio durante a faculdade.
Arquiteta e urbanista, Cássia teve uma trajetória interessante no mundo do paisagismo. Após se formar em 1993, Cássia foi para São Paulo, onde buscava emprego na área de paisagismo.
"Logo que me formei, fui para São Paulo com determinação. Precisava arrumar um emprego na área, trabalhar em algum escritório de paisagismo para aprender (...) Numa época em que São Paulo era o grande polo de paisagismo. Era uma construção cultural, mostrando o quanto o projeto de paisagismo era importante para os empreendimentos, áreas residenciais e, principalmente, para as cidades". Ela continua: "O único contato que eu tinha era o Benedito Abbud. Fui até o escritório dele para conversar e saber como estava a área. Na época, a arquitetura não estava muito bem, era um período de recessão na construção. Infelizmente, não havia vaga no escritório dele, mas ele me indicou outros lugares."
Ao escutar Cássia falar desses momentos iniciais de sua carreira, podemos pensar em um dos termos mais importantes para qualquer profissional em ascensão: o networking. Sem o networking, você não tem contatos, ou seja, meios para firmar sua reputação no meio profissional. Um grande exemplo de networking, como previamente citado, nos foi dado por Cássia, que mesmo sem vagas disponíveis no escritório de Benedito Abbud, ela persistiu e ligou para outros escritórios, incluindo o de Luciano Fiaschi. Embora Luciano também não estivesse contratando, ele a indicou para o escritório de Rosa Kliass, uma renomada profissional do paisagismo brasileiro. Cássia conseguiu uma oportunidade como estagiária no escritório de Rosa, mesmo que formada, onde trabalhou por um ano e meio. Esse foi o primeiro passo de sua carreira de prestígio como arquiteta-paisagista.
Após esse período, Rosa levou seu escritório para casa e sugeriu que Cássia trabalhasse com Luciano Fiaschi, outro grande nome do cenário de arquitetura e paisagismo com quem elas já haviam trabalhado e que desejava trabalhar com ela.
"A Rosa e o Luciano sempre trabalharam muito juntos, em parcerias e trabalhos. O que é muito interessante nessa área de paisagismo é que os profissionais, mesmo com escritórios independentes, se juntam em alguns projetos. Fazem parcerias para alguns projetos, e isso é muito rico porque você traz formações diferentes e experiências diferentes. Então, você acaba agregando muito dentro daquele trabalho."
Ainda naquela época, Cássia já via como é importante valorizar seus colegas de trabalho. Pensando nisso e na oportunidade de trabalhar com outro grande paisagista, Dias aceitou a proposta e embarcou em mais uma jornada.
"A minha grande formação na área de paisagismo, eu devo a ele. É claro que foi muito importante a minha passagem pelo Benedito Abbud, pela Rosa Kliass, mas eu acabei ficando no Luciano durante 7 anos. Foi realmente ali que eu me formei e que eu tive a oportunidade de aprender muito nessa área."
Coragem para explorar
Seguindo esses sete anos, Cássia resolveu se permitir a viver novas experiências e saiu do escritório de Luciano para abrir o seu próprio e mergulhar ainda mais no mundo do paisagismo.
"Enquanto escritório, foi aí que eu me associei com a Helena Lagoa, que é engenheira agrônoma. Foi um casamento que deu muito certo porque são formações diferentes e complementares. Desde então, a gente trabalha junto em parceria em vários projetos. Chegamos a ter um escritório físico em São Paulo juntas durante 10 anos. Quando me juntei com a Helena, resolvi implantar jardins para ver como isso funcionava na prática. Essa experiência mudou minha visão do paisagismo. Quando projetava, achava que estava incrível. Mas ao implantar o jardim, muitas vezes eu queria mudar tudo. Aprendi a ter mais noção do tempo que um jardim leva para se formar e a importância da paciência. Isso é especialmente relevante quando se trata de clientes residenciais. Preciso explicar que, embora o projeto de paisagismo esteja pronto, o plantio e os elementos construídos ainda precisam de tempo para se desenvolver."
O tempo do paisagismo
Cássia também destaca a importância de entender que o processo de criação de um jardim vai além do projeto inicial. O tempo de crescimento e evolução é fundamental, mesmo que a expectativa atual seja por resultados imediatos. E é uma função sua, como o paisagista responsável pelo projeto, explicar isso ao seu cliente.
"A hora que você termina (o projeto), na verdade, o jardim está começando. Ele vai ter todo um tempo para formar, e ele (o cliente) precisa entender isso e até ter prazer em acompanhar essa evolução do jardim. Porque a expectativa, principalmente hoje, está muito imediatista. A gente quer ver a coisa pronta. Eu não quero esperar um ano, um ano e meio para começar a ver esse jardim se transformar. Então, você acaba também mudando a sua relação e a forma como você lida com o cliente. É preciso explicar que, embora o projeto de paisagismo esteja pronto, o plantio e os elementos construídos ainda precisam de tempo para se desenvolver."
Além disso, Dias compartilha sua experiência acadêmica e como o ambiente universitário proporcionou discussões e enriquecimento para o trabalho prático como arquiteta-paisagista. Também menciona sua descoberta de uma paixão por ensinar e aprender, e como isso influenciou sua trajetória profissional.
"Chegou um período lá em São Paulo que eu comecei a transitar por uma outra área também, que foi a área acadêmica. Fui fazer uma pós-graduação. Depois de uns 10 anos de formada, achei que seria interessante voltar para a universidade para me atualizar, ver o que estava acontecendo de novo. Fui fazer uma pós-graduação nessa área de paisagismo na Belas Artes. Depois que eu terminei essa pós, surgiu a oportunidade de dar aula lá na UNINOVE. Nunca imaginei ser professora. Não estava nos meus planos nem nos meus sonhos, mas foi algo que se mostrou uma paixão. A hora que eu entrei em sala de aula, falei: "Nossa, é muito interessante você poder passar conhecimento e, ao mesmo tempo, adquirir conhecimento". Acho que é uma troca. Nesses anos de universidade, eu até brincava no final do semestre: "Bom, eu não sei se os alunos aprenderam, mas eu aprendi muito!". Você tem que estudar muito. Cada final de semestre era um grande aprendizado, um enriquecimento. E na universidade, acho que a gente tem um tempo de discussão que quando você está no teu escritório, você não tem, né? O mercado te exige um prazo de entrega de trabalho que é muito insano. Eu acho que esse prazo está acelerando ano a ano. Na universidade, você tem esse tempo de discussão, e eu acho que toda essa teoria que a gente trabalha lá depois melhora o seu trabalho prático. É uma troca."
Cássia Dias e suas várias áreas de interesse
Mesmo após já ter uma carreira consolidada, Cássia nunca deixou de estudar e explorar novos territórios. Durante a universidade, ela fez mestrado na UNICAMP, focando em transporte de massa, especialmente trens e metrôs. Posteriormente, foi convidada para trabalhar em um projeto de Parque Linear entre as estações Sacomã e Tamanduateí do metrô. Esse trabalho intensivo direcionou seu escritório para projetos de espaço público, incluindo estações de metrô e requalificação urbana. Embora nem todos os projetos públicos sejam implantados integralmente, Cássia vê cada porcentagem implementada como um ganho para a cidade, impactando positivamente a vida de mais pessoas. A área de urbanismo e requalificação a atrai profundamente. Ela não apenas projeta paisagismo, mas também acessibilidade e transformação urbana.
"Se eles implantam 30%, 40%, a gente enxerga como um ganho para a cidade. Você atinge muito mais pessoas. Acho que a gente tem a oportunidade de melhorar a vida de muito mais pessoas do que no projeto particular. Então, desde que eu comecei a faculdade, eu sempre gostei muito dessa área de Urbanismo, dessa área urbana. Acho que casou aí, né? Você não está só projetando o Paisagismo em si, mas sim uma requalificação, uma acessibilidade. É uma área que me atrai muito."
Ainda falando do urbanismo, Dias comentou sobre sua visão de escala e o que a interessa nessa área. Um paisagista tem uma escala de atuação delimitada, mas ela queria mais.
Sua amiga estava fazendo doutorado, o que a fez entrar no doutorado também, continuando a estudar sobre ferrovias, tema que já havia explorado durante o mestrado. Ela focou nas estações da CPTM de São Paulo e na história da construção das cidades da região, todas ligadas à chegada do trem. Mesmo com o trem não operando mais, os trilhos ainda cortam as cidades, mantendo essa presença marcante. No doutorado, Cássia investigou como essa relação com a ferrovia impacta as memórias das pessoas e contribui para a formação individual. Ela concluiu o doutorado com a intenção de talvez ingressar em uma universidade pública, explorando a área da Geografia. Embora tenha considerado essa mudança, a escala da Geografia é maior do que o que ela normalmente trabalhava, envolvendo intervenções em paisagens de centenas de quilômetros.
"Isso não é um micro Paisagismo, né? Não é uma coisa pequena, uma intervenção pequena. É uma intervenção na paisagem na escala de centenas de quilômetros. É muito atraente. Você olha e você fala: "Nossa, é a escala que eu quero, que eu quero discutir, que eu quero trabalhar."
Consequências da Pandemia
Quando Cássia concluiu o mestrado durante a pandemia, o ensino online afetou sua paixão pela sala de aula. A falta de interação presencial com os alunos, a impossibilidade de sentar junto para discutir e desenhar, bem como a ausência de grupos de discussão, contribuíram para essa sensação. Embora tenha considerado encerrar seu período de docência, ainda reconhece que o aprendizado contínuo é fundamental para qualquer profissional. O doutorado, assim como o mestrado, agregou à sua atuação profissional, independentemente da área. É importante entender que a formação não se encerra com a graduação; pelo contrário, o estudo constante melhora nossa capacidade de desempenhar nosso papel profissional.
Por isso, em 2022, Cássia pediu demissão e resolveu focar sua atenção no município para onde havia se mudado em 2014: Marília em São Paulo.
"É bem interior mesmo, embora seja uma cidade de porte médio, tem 200.000 habitantes, mas é bastante interior (...) Acho que 2014 foi quando o WhatsApp começou a explodir, então isso me permitiu trabalhar à distância, embora a cada 15 dias, mais ou menos, eu fosse para São Paulo, principalmente para reuniões. Acho que depois da pandemia, isso todo mundo percebeu que a gente pode trabalhar à distância, né? Que a gente pode fazer reunião, entrevista online, que, eh, essa nossa Tecnologia permite isso. Mas em 2014, isso não era muito comum (...) No começo, foi bem difícil me colocar. Porque as cidades do interior, elas já têm um núcleo mais fechado, um núcleo que já está acontecendo na cidade. Então, eu procurei conhecer os arquitetos que atuam na cidade."
Em Marília, além da arquitetura paisagista, Cássia atuou como professora e aprendeu a adaptar sua rotina de trabalho para a cidade pequena.
Cássia Dias e suas parcerias de sucesso
Falando de nomes importantes para a história de Cássia, Helena Lagoa não poderia ficar de fora. Donas do escritório de arquitetura-paisagismo Dias Lagoa, a parceria das duas profissionais é duradoura e cheia de sucesso.
"Eu sou casada com ela mais tempo do que eu sou com o meu marido. A gente tá junta desde 30 anos. É muito tempo, é muito tempo. Já fizemos bodas de prata."
Estão juntas desde 1995, há cerca de 30 anos. Celebraram bodas de prata e possuem uma conexão profunda. Seus pensamentos se entrelaçam quando projetam paisagens, quase como se dialogassem consigo mesmas. Complementam-se, pois suas formações distintas enriquecem o trabalho em conjunto. A simbiose entre elas é notável, e a parceria é alimentada por uma visão multidisciplinar do paisagismo.
"Ela tem um entendimento de arquitetura que talvez alguns arquitetos também nem tenham porque... Acho que essa visão do trabalho e da parceria, você vai aprendendo. Então, acho que é talvez essa multidisciplinaridade que exige o trabalho de paisagismo (...) A arquitetura muitas vezes fica mais isolada, mesmo que tenha o engenheiro para tornar aquilo real. A ideia toda vem do escritório, e você participa ali, mas é mais fechado em si mesmo. Já o Paisagismo é um campo que reúne pessoas, um grupo agregador. Dificilmente você faz tudo sozinho e resolve tudo sozinho; sempre precisa de ajuda. Isso é muito legal."
Além de Helena e todos outros citados, uma parceira de Cássia tão duradoura quanto é a AuE. Cássia é uma das nossas primeiras clientes e construiu sua jornada de sucesso ao nosso lado.
"Quando eu entrei no Luciano, a gente trabalhava ainda na prancheta, né? O escritório foi se reinventando e se adequando à tecnologia. Então, eu era muito jovem. A gente é sempre muito sedento às novidades. E ele falou: "Olha, eu tô pensando em trabalhar com o AutoCAD". A gente aprendeu juntos. Começamos a trabalhar ainda nesse período, mesclando um pouco do trabalho à mão com o trabalho no AutoCAD. Até que chegou um momento que o escritório praticamente só trabalhava mesmo no computador. Foi aí que entrou o AutoLANDSCAPE. Quando a gente já estava praticamente só trabalhando com o computador, claro que assim, toda a parte ainda de anteprojeto era muito feita à mão. A gente que é formado nesse período do manual ainda tem muito o croqui à mão. Esse processo criativo ainda acontece muito manualmente, mas rapidamente isso já vai pro computador. Eu acho o AutoLANDSCAPE fenomenal, especialmente na parte do projeto executivo. Lembro que, quando começamos no CAD, a gente ficava contando mudinha por mudinha. Então, num trabalho grande, isso era muito insano. Porque você fazia tudo manual, né? Inserir a chave, contar, montar tabela... Essa montagem de tabela no CAD é muito chata. Não era muito prazeroso chegar nesse executivo no CAD. Acho que a hora que a AuE chegou com essa proposta foi fantástica."
Dicas para Iniciantes
Para finalizar, Cássia Dias deixa uma mensagem para quem quer começar na área:
"Olha, eu acho que a primeira coisa, que foi fundamental na minha formação, é: eu acho que o ideal é você entrar num escritório de paisagismo. De preferência, um escritório que você tenha alguma afinidade, alguma admiração pelo trabalho que acontece nesse escritório. Isso vai potencializar o aprendizado. E aí você vai falar: "Ah, mas não é fácil, né? Como é que eu vou me candidatar e entrar?" É, não é tão difícil quanto parece. Eu acho que talvez a gente tenha um pouco de receio de entrar em contato com esses escritórios, porque a gente pensa: "Ah, não imagina, jamais! Eles vão me receber?" Mas muitos escritórios estão sempre muito abertos a, pelo menos, conversar com esse aluno. Então, se ele tiver a oportunidade ou pesquisar e tentar entrar num escritório para aprender com algum profissional da área.
Confira a entrevista completa:
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