A Catharanthus roseus: Uma Aliada Poderosa na Luta Contra o Câncer
Autor: Matheus Augusto P. Leôncio - Data: 30/08/2023
A Catharanthus roseus, ou "Rosa de Madagascar" e "Vinca rosa", como também é conhecida, é uma dicotiledônia pertencente à família Apocynaceae que é originária da ilha de Madagascar, mas que foi cultivada em diversos países sendo o Brasil um deles. É uma planta perene de caráter ornamental com pequeno porte, apresentando flores róseas e brancas durante o ano inteiro. Ela se encontra na lista de ameaçada de extinção devido a degradação de habitat pela agricultura de corte e queimada. A C. roseus tem grande importância na medicina pela produção de alguns alcalóides indólicos terpênicos, mas dois deles se destacam, a vinblastina e a vincristina, que são muito utilizados em tratamentos contra o câncer.
Ao longo dos anos, na medicina popular, todas as partes da planta (com excessão da raiz que é tóxica) eram utilizadas. Dentre suas utilidades podemos citar seu uso como sudoríficas, diurética, hipoglicemiante, febrífuga e como antileucêmica. Estas indicações que são baseadas na tradição popular não encontram apoio nos atuais estudos já desenvolvidos.
Além de sua beleza ornamental, a Catharanthus roseus é valiosa devido à presença de alcaloides em suas estruturas, que desempenham um papel crucial no tratamento oncológico. Os alcaloides são um grupo de substâncias nitrogenadas, que são geralmente de origem vegetal, amplamente estudados devido às suas ações antineoplásicas (combatem a proliferação desordenada de células no organismo)
Na Catharanthus roseus, existem 2 alcaloides que são destacados no tratamento da leucemia, a vinblastina e a vincristina.
A leucemia é um câncer que se inicia nas células-tronco da medula óssea. Na leucemia as células cancerígenas se multiplicam e consequentemente atrapalham a produção das células saudáveis na medula, diminuindo sua produção. Ela pode ser classificada de acordo com o tipo de célula sanguínea afetada, sendo os glóbulos brancos os principais envolvidos.
As propriedades da Vimblastina foram descobertas por Dr. Robert Laing Noble em 1952. O Dr. Noble recebeu um envelope de seu irmão Dr. Clark, que continha folhas da espécie, que de acordo com Clark, estaria sendo usado para fazer um chá que na ausência de insulina era tomado por diabéticos. Isso levou a uma investigações sobre as folhas da planta e logo descobriram que não afetava o controle de glicose no sangue, mas mostraram potencial na redução de glóbulos brancos, sugerindo uma possível cura para a leucemia. A vincristina foi descoberta anos depois, em 1958 por uma equipe liderada pelo Dr. JG Armstrong e após perceberem sua atividade antineoplásica logo a comercializaram. A vimblastina e a vincristina foram isoladas e aprovadas como agentes anticancerígenos pelo Food and Drug Administration (FDA) em 1961 e 1963, respectivamente.
As medicações consistem em injeções intra-venosas que são produzidas após o processo de isolamento, refinamento e purificação dos componentes da planta. As técnicas utilizadas são a cromotografia e a filtração. Quando a produção a partir da planta não é suficiente para atender aquela demanda, existe a possibilidade de produzir os alcaloides em laboratório, replicando sua estrutura química.
Em comparação com tratamentos convencionais, como a quimioterapia tradicional, a vimblastina e a vincristina tendem a causar menos efeitos colaterais adversos. Isso significa que os pacientes submetidos a esses tratamentos podem experimentar menos sintomas como náuseas, vômitos e outros desconfortos frequentemente associados ao tratamento do câncer.
Outro benefício notável da vimblastina e da vincristina é sua ação seletiva. Durante a mitose (divisão celular), esses medicamentos têm como alvo principalmente as células cancerosas, minimizando os danos às células saudáveis. Isso é uma vantagem significativa em comparação com tratamentos mais agressivos, que podem afetar tanto as células cancerosas quanto as saudáveis, causando mais efeitos colaterais indesejados. Esses alcaloides são frequentemente usados em combinação com outros tratamentos, como a quimioterapia. Isso não apenas aumenta a eficácia do tratamento, mas também permite que os médicos utilizem doses mais baixas de outros medicamentos, o que pode reduzir os riscos e os efeitos colaterais associados à quimioterapia convencional.
Essa redução nos efeitos colaterais pode significar uma maior qualidade de vida para os pacientes durante o tratamento.
Embora o uso de compostos da Rosa de Madagascar seja bastante promissor e útil, existem efeitos adversos graves que podem acompanhar o tratamento com a vincristina, e a gravidade e incidência dos sintomas estão relacionadas à duração do tratamento e as doses recebidas pelos pacientes.
Podemos citar como efeitos colaterais do fármaco a mielossupressão, que é a diminuissão da atividade da medula óssea, interferindo assim na produção de células de defesa, células que transportam o oxigênio pelo sangue e até as que ajudam no processo da coagulação sanguínea.
Entretanto, a sua neurotoxicidade associada à neuropatias (doença que atinge o funcionamento dos nervos periféricos) é o principal fator limitante de seu uso. A mais comum é a neuropatia periférica dos nervos sensoriais e motores que tem como sintomas a dormência, parestesia, redução do equilíbrio, entre outros. Essa neurotoxicidade está associada a dosagem correta do fármaco, necessitando assim da prescrição correta da dose a nível terapêutico.
Além desses dois alcaloides vale ressaltar também a importância da ajmalicina, um vasodilatador e antihipertensivo, também a vindesina, um poderoso antimitótico que é indicado no tratamento da leucemia linfoblástica e alguns tumores sólidos, no tratamento da hiperseborréia temos a utilização da tetraidoalstonina junto a ajmalicina.
Fonte: Guilherme Motta
Até hoje estão sendo realizadas pesquisas mais aprofundados da Catharanthus roseus com o intuito de aproveitar o máximo de seus compostos e de “driblar” esses empecilhos que possam vir atrapalhar o tratamento. Indústrias veem fazendo grande esforço para sintetizar esses alcaloides a fim de centralizar essa produção, mas elas ainda continuam sendo obtidas através do cultivo da planta em vários países tropicais, inclusive o Brasil. Acreditamos que com o desenvolvimento da nanotecnologia e das áreas clínicas a tendencia será uma grande evolução no quadro de medicamentos úteis no tratamento de doenças, diminuindo assim a dificuldade de combatê-las.
Referências:
Valente, Patricia, et al. Vincristina: Perfil Farmacológico. História E Perspectiva. Passado, Presente E Futuro. International Journal of Development Research, 28 June 2022, pp. 57007–57011.
HARRI LORENZI; MATOS, F. J. A. Plantas medicinais no Brasil : nativas e exo´ticas. Nova Odessa, Sp: Instituto Plantarum De Estudos Da Flora, 2008.
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