Conhecimento Tradicional e Uso de Plantas: a Etnobotânica em Foco
Autor: Matheus Augusto P. Leôncio - Data: 01/08/2023
A Etnobotânica é o estudo das interações entre as pessoas e as plantas, incluindo o conhecimento tradicional sobre o uso das plantas em diversas culturas, ela se preocupa com os sujeitos e com os seus saberes, reunindo informações dos que mantiveram relações com os vegetais e também com elementos culturais de um povo.
Nos dias atuais, ela tenta se comprometer com o mundo em desenvolvimento, adotando uma posição estratégica com seu foco integrativo. A etnobotânica é uma fascinante ciência de caráter multidisciplinar, envolvendo um amplo leque de profissionais, como botânicos, antropólogos, farmacólogos, médicos e engenheiros. Além disso, é uma verdadeira interdisciplina capaz de fornecer insights valiosos sobre a relação das comunidades humanas com o reino vegetal, explorando as dimensões antropológica, ecológica e botânica desse vínculo.
Em sua essência, ela encontra conexões com a linguística, conforme apontado por alguns estudiosos. Esse ramo da etnociência busca compreender o conhecimento das diversas sociedades em relação aos processos naturais e à interação humana com a natureza.
O etnobotânico Richard Schultes trabalhando com o Xamã Salvador Chindoy, em 1960
Fonte: Harvard Magazine
Nesse sentido, explora a lógica subjacente ao conhecimento humano sobre o mundo vegetal, incluindo as diversas taxonomias e classificações criadas por diferentes povos. Essa interseção entre saberes tradicionais e conhecimento científico moderno torna a etnobotânica uma área de estudo rica e complexa, que nos permite desvendar os mistérios da relação humana com o mundo vegetal e apreciar a diversidade de perspectivas sobre a natureza.
Por outro lado, o paisagismo é a arte e a ciência de criar espaços ao ar livre, utilizando elementos naturais e construídos para melhorar a estética e a funcionalidade de um local. Esses dois campos combinados resultam na criação de espaços que são culturalmente relevantes, ecologicamente sustentáveis e socialmente significativos, promovendo a conservação da biodiversidade e o bem-estar das pessoas que interagem com esses ambientes.
Etnobotânica na medicina:
Ao longo dos registros da história sobre médicos notáveis da antiguidade, como Hipócrates, Avicena e Paracelcius, as plantas medicinais sempre tiveram um papel de destaque em suas práticas. Eles valorizavam o conhecimento popular sobre as propriedades medicinais das plantas e, a partir desse saber, fizeram importantes descobertas de medicamentos que ainda são utilizados pela medicina moderna até os dias atuais. Os salicilatos (grupo de fármacos muito úteis no tratamento de inflamações, antipirese, analgesia e artrite reumatóide), por exemplo, foram descobertos através de estudos no Salgueiro Branco (Salix alba), que era muito usado por índios norte-americanos no tratamento contra dor e febre.
Salgueiro Branco (Salix alba )
Fonte: INaturalist
O reino vegetal é um poderoso laboratório de síntese, além de ser o maior reservatório de moléculas orgânicas conhecidas. Até hoje diversas moléculas complexas dependem de síntese biológica, já que a síntese em laboratório é economicamente inviável ou não pode ser feita, como é o caso dos esteroides, da pilocarpina ou dos digitálicos.
Outras contribuições da Etnobotânica
A etnobotânica também pode ajudar preservação da flora utilizando o conhecimento adquirido pela sua investigação científica, na ampliação do conhecimento sobre as propriedades úteis de espécies vegetais, e em subsídios para estudos étnicos, antropológicos, botânicos e ecológicos sobre os povos envolvidos na pesquisa.
Etnobotânica X Paisagismo
A associação entre etnobotânica e paisagismo pode resultar em espaços mais ricos em termos de significado cultural, biodiversidade e conexão entre as pessoas e a natureza, já que a inclusão de espécies vegetais em projetos paisagistas pode contribuir para o bem-estar do ser humano e também de outros animais. A designer de interiores, engenheira civil e paisagista Solange Fleurs, compartilhou conosco em sua matéria A neuroarquitetura da fachada do restaurante Beef , um projeto de paisagismo que incluía elementos vegetais como itens importantes para o projeto, visando o bem-estar dos clientes, aperfeiçoando assim a essência do ambiente. A utilização de plantas e outros elementos naturais aos projetos de paisagismo contribuem para o melhoramento do nosso " meio ambiente " já que também caracterizamos como meio ambiente os lugares onde não possuem elementos inteiramente puros e com interferência humana. O meio urbano não deve ser entendido como algo oposto a natureza, já que ele constitui o lugar onde o homem vive e no qual desenvolve sua própria natureza. Como Robert E. Park citou em 1925 " A cidade é um produto da natureza e particularmente da natureza humana".
Ao pesquisar por plantas que têm significado cultural ou histórico em uma determinada comunidade, o paisagista pode incorporar essas espécies em seus projetos. Isso pode ser feito tanto para conectar a comunidade com suas raízes culturais quanto para preservar e promover o conhecimento tradicional sobre essas plantas. Na utilização de vegetais em projetos com caráter cultural é importante lembrar que a abordagem deve ser sensível e respeitosa, levando em consideração a preservação do conhecimento tradicional e a promoção da diversidade cultural.
REFERÊNCIAS:
PLOTKIN, M. Richard Evans Schultes. Disponível em: https://www.harvardmagazine.com/2022/07/vita-richard-evans-schultes. Acesso em: 1 ago. 2023.
Etnobotânica. Disponível em: https://ambientes.ambientebrasil.com.br/natural/artigos/etnobotanica.html.
ROCHA, J. et al. Etnobotânica: um instrumento para valorização e identifi cação de potenciais de proteção do conhecimento tradicional Ethnobotany: a instrument for valorisation and identifi cation of potential for the protection of traditional knowledge Ethnobotanique: un outil pour la valorisation et l’identifi cation du potentiel de protection des savoirs traditionnels Etnobotánica: una herramienta para la valoración e identifi cación del potencial para la protección de los conocimientos tradicionales. 2013.
LÍVIA, M.; MODOLO. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/91/91131/tde-11102022-110133/publico/Livia_Maria_Ongaro_Modolo_versao_revisada.pdf.
Veja também:
* Identificação e conservação de espécies vegetais ameaçadas
* Os segredos dos biomas: como a ciência estuda a flora e fauna em todo o mundo
* O melhoramento Genético na Produção de Cultivares Vegetais
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